Nas duas semanas anteriores falamos, neste espaço democrático, sobre a proposta de Enrique Leff, no livro Racionalidade ambiental, no sentido de que é necessário e urgente a reapropriação social da natureza, que restou apreendida pela racionalidade econômica, a explorar o meio ambiente desenfreadamente e até as últimas consequências.

O que prevalece, na (i)racionalidade econômica, é o momento presente, a necessidade do momento. O aqui e agora! E, infelizmente, muitos dos beneficiados com essa aludida exploração, como, por exemplo, a minerária, dentre outras, acabam concordando ou fazendo vistas grossas à exploração ambiental, mesmo que esteja acontecendo bem debaixo de nossos olhos e mesmos que visível a destruição irreversível da natureza. Pensa-se com o presente e olvida-se do futuro. É um egoísmo que já prejudica esta geração e que também prejudicará várias próximas gerações.

Esta irracionalidade decantada por Leff é em razão de “O modo de produção capitalista submeter a natureza à lógica do mercado e às normas de produção de mais-valia, ao mesmo tempo que as potencialidades da natureza e do ser humano se convertem em objetos de apropriação econômica” (Leff, p. 57).

Portanto, o mercado cooptou a natureza e dela se serve como objeto de consumo. Tudo em prol do mercado, que não tem uma falsa ética, eis que o gastar, o consumir, está acima de tudo e de todos. O pensamento é sempre em favor do lucro, não com a preservação da natureza. E é por isso que se torna urgente colocar a natureza também como objeto de direito e, apesar da resistência de alguns conservadores, basta pensar que nós também somos parte de um todo, que é a natureza, e que todos merecem iguais tratamentos. E, como sabido, a maneira mais cômoda de negar direito é coisificar as outras partes da natureza e a própria natureza e tornar o homem como soberano de tudo. E, convenhamos, nada há de democrático neste pensamento. Ao contrário, é um pensamento totalitário, antagônico e excludente.

A coisificação como técnica de negar direito foi encampada até mesmo entre os homens, a exemplo da escravidão e também da chamada raça pura, na qual os demais, impuros, estavam alijados do direito e eram queimados em fornos nos campos de concentração do demente Hitler e seus séquitos. E, o pior de tudo, é que não aprendemos a lição. Estamos coisificando nossos semelhantes, em razão da ideologia, de suas opções sexuais, religiosas etc.

E a coisificação da natureza, dos animais, é um dogma, advindo dos velhos filósofos, no sentido de que somente o homem pode ser sujeito de direito. Este dogma, felizmente, no momento presente, é corretamente questionado e já se fala na natureza como sujeito de direito e parece-nos que esta é a proposta de Henrique Leff, que precisa ser mais bem entendido e lido, tudo em prol da superação desta (i)racionalidade econômica.

E não é correto falar que, aderir às propostas deste sociólogo ambientalista, Henrique Leff, é ser um esquerdista, como são rotuladas as pessoas, no momento presente, quando acusam as fragrantes falhas do capitalismo e pugnam por um mudo melhor, através das necessárias correções de rotas que esse sistema está a exigir.

Essa necessária reapropriação da natureza é difícil, sabemos, eis que “Em todo caso, o conceito de natureza, já na transcendência da separação com a sociedade em uma visão organicista ou econômica do mundo, não logra emancipar-se do objetivismo que foi impresso na racionalidade econômica pela ontologia naturalista e objetivista do mundo. A crítica da razão econômica de Marx fica enredada na própria compreensão do ‘natural’, na cumplicidade entre a naturalização e a economização do mundo, na concepção do progresso civilizatório, sobredeterminado e condicionado pela base econômica, pelo modo de produção, na dialética transcendental que leva, através do modo de produção capitalista, a subordinar o valor de uso ao valor abstrato, à lógica do mercado, alienando o ser na coisificação do mundo” (Leff, 56/57).

Entretanto, não é impossível chegarmos à racionalidade ambiental, desde que estejamos disposto a tanto. Contribuiu para à adesão a essa proposta de Leff o momento atual, como a falta de água, com a possível necessidade, consequência da crise hídrica, de um racionamento de energia, sem falar nas inundações, em outro momento, no calor excessivo e no tempo seco e árido. Na verdade e apesar de tudo, alguns ainda insistem em dizer que tais acontecimentos não são consequências da exploração descontrolada da natureza. Porém, negacionistas existirão sempre, mesmo que os fatos presentes.

E o lado bom de tudo, a contribuir para que a racionalidade ambiental aconteça, são as pesquisas existentes, com vários doutrinadores descomprometidos com o capital, bem como a atual geração, que já preocupa com a natureza e quer preservá-la. É uma outra mentalidade, a desta geração presente, excluindo os negacionistas, evidentemente.

A título de exemplo, fazemos, a professora Marisa e eu, parte de um grupo de pesquisa que trabalha com essa matéria, ou seja, preservação da natureza, e os alunos demonstram, através das apresentações que cada um faz, que compreenderam a necessidade de aderirmos à proposta de Henrique Leff, que nada mais é do que uma real e necessária preocupação com a preservação da natureza.

Afinal, quer nos parecer que preservar a natureza faz parte dos direitos fundamentais, ditados pela Constituição Republicana de 1988, eis que não é um catálogo fechado e exaustivo e poderíamos dizer que, preservar a natureza, é o número um dos direitos essenciais, eis que, sem natureza, não há ser vivo e sem ser vivo não há que se falar em direito.

Newton Teixeira Carvalho – Dom Total