A exemplo da escritora Cora Rónai ando obcecado por livros. Aliás nunca deixei de ser e nada soa mais provocativo do que isso hoje em dia em um país que proporcionalmente quase não lê e é desgovernado por um elemento que não sabe se livro é artigo para comer, servir de apoio às suas ferraduras ou para calçar as portas do seu estábulo-quarto.
Assim sendo outro dia li uma crônica da Cora (enviada por minha amiga Lu Damasceno) onde ela confessava a realização de seu sonho de catalogar a sua biblioteca que tem (como a minha ) uns 5 mil volumes. Daí pergunto a ela e a mim mesmo, sem ter resposta: é preciso tanto livro? “quem lê tanta letrinha?” parafraseando aqui Caetano Veloso.
A tarefa que Cora empreende no começo desse ano eu realizei há dois anos, numa faina que durou meses e até hoje considero imperfeita. Cora é mais tecnológica do que eu e está tocando o trabalho com ajuda de aplicativo porque, como bem aponta, “nem sempre a gente se lembra de tudo o que tem ou de onde cada volume está”. Fato inquestionável.
Ter uma biblioteca tão grande é lembrar todos os dias o dito de Schopenhauer que dizia que seria ótimo se ao comprarmos livros também comprássemos o tempo para lê-los. Evidente que não li os 5000 volumes que estão aqui do meu lado, mas posso lhes garantir que passei os olhos, folheei e li ao menos trechos de todos eles.
Apesar de Cora garantir que tudo mudou depois que apareceram os aplicativos de organização de livros (como o Libib) eu não me arrisco em lidar com a engenhoca já que mal ou bem aprendi a navegar na minha biblioteca que cataloguei por assunto e ordem alfabética de autores e nessa lida descobri que muitas vezes tinha mais de um exemplar do mesmo livro. Distração de leitor voraz.
Trago o assunto que pode parecer fútil à baila (embora creia que o tema livro nunca seja fútil) porque por coincidência enquanto Cora arrumava as suas estantes na Lagoa não muito longe de lá, no Leme, eu debatia com amigos as vantagens e desvantagens de desgrudar de uma biblioteca tão numerosa. Motivo: se quiser mudar para o Rio em definitivo não vou conseguir levar a biblioteca que dispõe de espaço imenso na casa aqui da grande São Paulo. Aí surgiram as amigas me instando ao desapego (“doa para uma comunidade”, “abre um sebo pequeno no Leme”) o que para mim seria um baita desafio. Cheguei a pensar na possibilidade que não resistiu ao meu reencontro com a biblioteca de quatro metros de altura, sua escada de correr e seus milhares de livros. Aí, entreguei os pontos e decidi que ao menos por enquanto não estou preparado para essa separação muito embora saiba que não vai dar tempo de ler tudo que tenho à mão e sigo comprando, ganhando, acumulando. Entreguei os pontos e no melhor estilo resignado lembrei da frase-chave dos procrastinadores: “não deixe pra depois o que você pode deixar pra lá”. Pelo menos por enquanto.
Ricardo Soares – Dom Total