Picasso dizia que levava muito tempo para nos tornarmos jovens. Certas formas de liberdade e frescor na vida só aparecem com experiência e sabedoria. A natureza da juventude pertence ao moço, mas a arte da jovialidade é fruto da maturidade. Como imaginar que o primaveril atravesse verão, outono ou mesmo inverno sem perder sua graça e encanto?

O juvenil, certamente, é uma armadilha. Seu viço é meramente externo e acaba denunciando o sabor adstringente do verde ou do imperfeitamente amadurecido. Isso porque a graça vai bem com o singelo, mas nunca com o simplório; com o ingênuo, nunca com o novato. Ou como Arthur Clarke ironizava: “Deve ser maravilhoso ter dezessete anos e de tudo saber!”. Ou seja, o juvenil não cabe nem na estética nem no juízo do veterano! O jovial, por sua vez, possui um atributo essencial que é “a indiferença do bem”.

A palavra indiferença em geral tem uma associação negativa com a ideia de abatimento ou insensibilidade. No entanto, a capacidade de ficar indiferente pode significar a existência de uma referência maior que nos impeça de ser afetados, permitindo que se fique indiferente a algo.

Quando, por exemplo, há algo muito excitante para fazer, podemos ficar indiferentes a dormir ou a se alimentar. Indica que algo maior nos libera de certas necessidades. O mesmo acontece na experiência da inveja, em que a “indiferença do bem” – uma perspectiva maior tornando certas coisas irrelevantes – possa nos resgatar de um lugar ordinário.

O jovial inclui essa “indiferença do bem”. Movido pela vida, pela grandeza de sua alegria, o jovial pode evitar as pequenezas da rotina e assim flanar pelo mundo desafetado nessa condição maior.

Enfim, o jovial é a atitude interna capaz de produzir o efeito: “Nossa você está ótima! O que você fez?”. E a resposta bem pode ser: “Fiquei um pouco mais indiferente!”.

 

Nilton Bonder
Rabino da Congregação Judaica do Brasil (CJB), idealizador do Midrash Centro Cultural e escritor. Autor de livros reconhecidos nacional e internacionalmente.