Com o ano de 2020 indo para o fim a gente pode se perguntar à guisa de Proust: estamos em busca do tempo perdido? Como resumir esse ano pandêmico e maluco para contar aos netos? Como fazer que não pareça uma distopia ficção cientifica, se é que vai haver futuro depois de tudo isso? Como relativizar mais de 156 mil mortos?

O pior de tudo isso é juntar o estrago da pandemia com um desgoverno de pesadelo contra o qual nenhum texto, protesto ou indignação parece fazer efeito. Tanto que segue firme e forte com apoio de grande parte do seu gado manipulado por fake news e distorções históricas que dão conta de ter existido aqui um país comunista que jamais existiu. Um desgoverno que se empenhou em piorar mais ainda o que já era ruim ao sabotar quarentenas e incentivar aglomerações, rir das máscaras e da ciência. Bozonazi segue se credenciando cada vez mais, pra ser não só o pior presidente da nossa história mas como dos piores governantes da história moderna. E olha que a concorrência é grande.

Tudo isso vai na contramão da reputação brasileira de combate a doenças infecciosas com nomes de destaque mundial como Oswaldo Cruz, Carlos Chagas, Vital Brazil e outros. Cientistas que se vivos estivessem estariam na linha de frente contra Bozo e, evidentemente, esculachados por ele. Afinal é moda entre essa gente desprezível do desgoverno rir do conhecimento, da sabedoria, da grande arte como vimos ainda semana passada quando esse inominável ministro das Relações exteriores esculachou João Cabral de Melo Neto (um dos nossos mais importantes poetas) numa formatura de diplomatas do Instituto Rio Branco.

Ideologias à parte, é claríssimo para homens e mulheres de boa vontade (e não a tal “gente de bem” que os fascistas cultuam) que o Brasil vive uma idade média, uma era de trevas onde conquistas de décadas estão sendo solapadas todos os dias enquanto um desgoverno vê inimigos imaginários na China e Argentina, por exemplo, o que é uma estupidez sem tamanho até porque os países citados são dois dos nossos principais parceiros comerciais.

E, enquanto o mundo inteiro espera pela vacina, seja qual for sua origem, a gente tem que combater não apenas a pandemia, mas esse conluio de horrores retrógados que corroem o país turbinando corrupção sob pretexto de combate-la. Se não nos curarmos disso a curto prazo estaremos condenados às trevas civilizatórias que aqui avançam com força. Estaremos sim, por muito tempo, em busca do tempo perdido. Um tempo que perdemos quando elegemos uma epidemia perigosa e pestilenta para a presidência de nossa combalida República.

 

Ricardo Soares – Dom Total