A 26ª Conferência das Nações Unidas sobre as Mudanças Climáticas (COP-26) precisa abrir um novo ciclo em que as propostas apresentadas por líderes governamentais sejam cumpridas ante às urgências climáticas que “ardem na pele” da população. Essas urgências revelam tropeços da humanidade e, particularmente, da sociedade brasileira. E não é suficiente delegar a responsabilidade às autoridades. A sociedade civil precisa assumir a sua insubstituível tarefa de acompanhar e interpelar os governantes sobre o adequado tratamento da casa comum. Também as instâncias parlamentares têm a importante responsabilidade legislativa de fazer avançar acordos que busquem a proteção do planeta. Nessa missão, é muito necessário acompanhar as movimentações sobre os processos que podem inviabilizar conquistas e até mesmo gerar prejuízos significativos. No contexto da COP-26, por exemplo, presenças e ausências de autoridades convidadas já sinalizam a disponibilidade para efetivar, ou não, acordos estabelecidos na Conferência. Há de ser considerada, ainda, a força do mercado, vetor determinante para avanços ou retrocessos na luta contra as mudanças climáticas. Mercado e política contracenam no desafio de alcançar avanços na busca por um desenvolvimento sustentável e integral.

O contexto socioambiental exige intervenções urgentes, pois a humanidade não pode mais permanecer envolta pela cegueira que o dinheiro provoca – o lucro ambicioso e perverso compromete muitas formas de vida no planeta. Por isso mesmo, as narrativas sobre a casa comum precisam entrar, com mais frequência e familiaridade, nas pautas cidadãs. É preciso que a sociedade civil esteja bem informada para se posicionar, por meio dos mecanismos possíveis e disponíveis, a respeito dos compromissos assumidos por governos e organismos internacionais. Indispensável é o horizonte rico e muito bem articulado da Carta Encíclica Laudato Si’, do Papa Francisco, com arquitetura de um fundamental processo educativo. Essa aprendizagem viabilizada pela Carta Encíclica inspira sensibilidades e honestidade para as urgências socioambientais. Um contraponto às conveniências e às manipulações legislativas, às leniências e às concessões em desfavor do planeta, rumo às catástrofes climáticas.

Quando se considera a realidade brasileira, os números, as ações governamentais e as tentativas de flexibilização legislativa são preocupantes. Lamentavelmente, os discursos ainda são mais demagógicos que incidentes – não possuem força para correções. Considerando as informações do Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas (IPCC), o aumento da emissão de gases de efeito estufa já provoca transformações prejudiciais irreversíveis no Brasil. Uma realidade que exige o compromisso ético-moral de cada cidadão brasileiro na tarefa de promover mudanças no tratamento dos recursos naturais do País. A desarvorada ânsia por riquezas e lucros leva a situações climáticas cada vez mais danosas em todas macrorregiões que integram o território nacional. O enriquecimento de alguns coabita com um crescente amargor da população que pode se acentuar nos dias vindouros.

Para se efetivar as soluções técnico-científicas de modo a frear o aquecimento global é preciso contar com a dedicação dos cidadãos e com a responsabilidade daqueles que ocupam as instâncias do poder. A sociedade brasileira, nos trilhos da esperada seriedade dos governantes, de coerentes escolhas legislativas e de decisões judiciais inequívocas, requer mais investimentos para efetivar uma educação ambiental no horizonte inegociável da ecologia integral. Assim, todos poderão reconhecer que o peso dos efeitos prejudiciais das mudanças climáticas alcança cada pessoa, mas pagam o preço mais alto os empobrecidos e excluídos, especialmente castigados pelas secas, enchentes, geadas e outros fenômenos climáticos.

Há de crescer, mais aceleradamente, a sensibilidade para escutar os clamores dos pobres e da casa comum. Assim, sejam edificadas ações que ultrapassem a contemplação de interesses egoístas e a busca pelo enriquecimento predatório. É hora de construir entendimentos a partir do diálogo, para corrigir descompassos que levam a um desenvolvimento parcial e excludente. Dentre os desafios, busque-se reconhecer a importância dos povos indígenas, na sua sabedoria inigualável na conservação ambiental, para ir além dos interesses oligárquicos minerários ou agropecuários. Um exercício urgente quando se sabe das movimentações para derrubar o marco temporal constitucional, em nome de ambições que desconsideram não somente os povos indígenas, mas também o equilíbrio do ecossistema na casa comum. A COP-26 precisa ser real sinal de esperança e abrir um novo ciclo no planeta, balizado por solidariedade e respeito. Não se pode perder tempo, pois são urgentes novas posturas, rigoroso zelo para evitar retrocessos na preservação ambiental, buscando sempre defender a vida no planeta. Os ecos da COP-26 inspirem profunda mudança no Brasil e no mundo, para que a humanidade viva um desenvolvimento integral e sustentável.

 

Dom Walmor Oliveira de Azevedo
Arcebispo metropolitano de Belo Horizonte, Presidente da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB).