A direção a ser seguida para que a sociedade brasileira saia da crise política e econômica que a consome é estar sempre do lado da justiça. Não há outro rumo possível para os que buscam superar situações tão graves. O lado dos partidos políticos é muito frágil, pois guarda o hábito de se fazer da política instrumento para atender a interesses que, frequentemente, estão na contramão do bem comum. Os números da corrupção, que corroem o erário, causam horror e revelam práticas com raízes vergonhosas no passado. Do mesmo modo, o lado das ideologias, que têm imprescindível importância nos debates sadios, intercâmbios de pontos de vista, torna-se inadequado quando alimenta polarizações. Sem diálogo, processos necessários para o bem do povo são interrompidos e prejudicam-se as clarividências.

Adequada rota é a indicada pela justiça, pois tem caráter corretivo. É remédio para descompassos que a política partidária não conseguirá corrigir nos hábitos culturais, nas máquinas governamentais e no conjunto de interesses particulares. Seguir a direção da justiça possibilita a reinvenção de funcionamentos, a abertura de novos ciclos que levem ao desenvolvimento integral, à consciência cidadã compatível com a modernidade, no horizonte dos entendimentos antropológicos de uma sociedade pluralista. Parece incontestável, assim, que o lado da justiça precisa ser ocupado por todos, particularmente assumido pelas instâncias superiores que regem os passos da sociedade. Em meio às derrocadas, no âmbito do exercício dos poderes que sustentam a democracia e o Estado de direito, surge um broto de esperança no topo da magistratura, com força para inspirar os guardiões da justiça. E a sociedade carece de referências para fortalecer os valores da verdade e da liberdade, tão ameaçados no contexto atual.

Justiça, verdade e liberdade são princípios indissociáveis, necessários a uma sociedade digna. A reciprocidade entre esses três princípios encontra na referência da justiça o ingrediente terapêutico e corretivo. Possibilita eliminar vícios e mediocridades que se tornam hábitos entre cidadãos, no exercício de suas responsabilidades, com o consequente comprometimento da qualidade das contribuições na edificação da sociedade solidária. A justiça, quando preside desde as condutas cotidianas no contexto familiar aos âmbitos complexos de governos, torna-se vetor que qualifica a vida, estimula a prática pessoal de virtudes alicerçadas em valores morais, tão necessários à verdade e à liberdade. Trata-se de caminho para eliminar conchavos, superar a perda de tempo de se buscar vitórias e conquistas partidárias, deixando em segundo plano os investimentos na gestão, em modernizações, na reinvenção de práticas, tarefas fundamentais para semear o bem na vida de todos.

Estar ao lado da justiça permite enxergar que a autoridade máxima da nação é o povo e que os governantes devem ser servidores. É virtude que orienta todo cidadão a buscar oferecer, a cada pessoa, o que, de fato, é devido, sem favorecimentos ilícitos a grupos privilegiados. Em sentido amplo, ser justo é articular, inteligentemente, as dimensões sociais, políticas e econômicas, para superar os abismos da desigualdade. Relaciona-se, assim, com consideração do inegociável valor de cada pessoa, de sua dignidade e de seus direitos, tão ameaçados pela generalizada tendência de somente buscar a acumulação egoísta de riquezas.

Por isso, há de se priorizar a adequada inclusão dos pobres, para além de programas meramente assistencialistas. A prioridade deve ser a escuta de seus clamores, exercício que fecunda a audácia, a coragem, a inteligência e a compreensão de todos, principalmente dos representantes do povo, capacitando-os para o desenvolvimento de programas e projetos que objetivem o bem comum. A escuta diária e prioritária dos clamores dos pobres é força indispensável que conduz todos para o lado da justiça.

 

Dom Walmor Oliveira de Azevedo
Arcebispo metropolitano de Belo Horizonte, Presidente da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB).