É necessária a entrada em cena de um novo ator, que indique a saída. Caso contrário, no lugar de novela brasileira, teremos um filme de Tarantino no qual todos se matam.
Durante os últimos dois anos, os brasileiros acompanham, embasbacados, uma novela que parece não mudar de rumo. Mocinhos pertencentes ao Poder Judiciário, ao Ministério Público e à Polícia Federal desmascaram políticos e empresários corruptos, usando todos os instrumentos da lei, e até por momentos extrapolando seus limites. Isso não diminui o justo entusiasmo dos espectadores com os mocinhos, pois estão revoltados e nauseados com os bandidos que roubaram o dinheiro do povo.
Acontece que a trama se complicou. Os mocinhos fizeram um serviço aplaudido por todos, mas no caminho foram destruindo possíveis saídas para a trama, pois não possuem os instrumentos para solucionar o imbróglio. Tampouco ajudam os meios de comunicação, que alimentam o público com os últimos lances do dia, sem parar para discutir para onde se dirige o desfecho.
Se faz necessária a entrada em cena de um novo ator, que indique a saída do labirinto. Caso contrário, no lugar de uma telenovela brasileira, teremos um filme de Tarantino no qual todos os personagens se aniquilam entre si.
Fim da metáfora.
A crise brasileira é uma crise política. Os partidos perderam sua legitimidade, pois todos eles embarcaram em manobras de conjuntura, olhando para as nuvens, e não para o céu, para os ganhos e perdas deles, e não do pais, Como se Temer ficar ou sair fosse um programa político para o futuro do Brasil. Estamos presos a bolhas que nos apequenam.
Chegou a hora de a sociedade civil exigir dos políticos comprometidos com o bem público a se disporem a trabalhar juntos, pensando no futuro, e não em candidatos. Devem fazer avançar uma frente política, suprapartidária, que coloque como prioridade no Congresso Nacional a reforma política.
Só uma reforma política que diminua o número dos partidos, permita ao eleitor ter maior informação e controle sobre seus representantes e reduza o custo e regule o financiamento das campanhas, poderá permitir que o próximo Congresso não seja uma versão do atual, que inviabiliza a governabilidade.
Uma frente parlamentar, de políticos dos mais diversos partidos, que inclusive possa gerar a base de uma nova agrupação eleitoral, com um programa mínimo de reformas básicas que tirem o pais do atoleiro.
Um programa que acompanhe os sentimentos amplamente difundidos na cidadania: em favor de um Estado que se concentre em oferecer serviços públicos de qualidade e apoie os setores mais desfavorecidos, e de uma economia com menos amarras burocráticas e carga tributária.
Uma frente que lute por uma reforma da Previdência que elimine primeiro os privilégios mais gritantes usufruídos por políticos e setores de funcionários públicos, para logo ter a legitimidade necessária para fazer avançar outras medidas mais amplas.
Uma frente que possa ser o embrião de um partido político que se assuma como um centro radical, sensível tanto às necessidades sociais como às demandas empresariais legitimas, que modernize o Estado, avesso ao corporativismo e com um sólido código de ética, aberto às transformações de valores promovidos por grupos identitários e às exigências de respeito ao meio ambiente.
Poderemos assim mudar de rumo, salvar a democracia e recuperar a esperança.
Bernardo Sorj
Sociólogo brasileiro, professor titular aposentado de Sociologia na UFRJ, diretor do Centro Edelstein e Plataforma Democrática.