Em um Brasil cada vez mais marcado pela divisão e pela intolerância, a Igreja Católica, no Brasil, liga a celebração pascal à solidariedade fraterna. Há mais de 50 anos, sempre na 4ª feira de cinzas, se abre a Campanha da Fraternidade. Neste ano, a Campanha da Fraternidade não insiste em um problema social determinado. Não se centra em um determinado desafio social, como tem ocorrido em outros anos. Desta vez, o tema é assunto central da fé e da convivência social: Fraternidade e vida: dom e compromisso. A irmandade que Jesus veio criar em nós e entre nós é para defender a vida como dom divino e compromisso de amor e solidariedade em relação a todos os irmãos e irmãs. O evangelho e a Campanha da Fraternidade 2020 nos chama a aprofundarmos o significado mais profundo da vida e a encontrarmos caminhos para que a vida seja valorizada e defendida. O lema desta CF 2020 é a palavra de Jesus sobre o samaritano: “Viu, sentiu compaixão e cuidou dele” (Lc 10, 33- 34).
Precisamos ligar a fé em Deus e a espiritualidade à urgência do cuidado social com as pessoas marginalizadas. Cada dia mais, cresce em nossas cidades a população de rua. Milhares de pessoas jogadas nas calçadas e embaixo de viadutos como se fossem lixos. Uma multidão de pessoas que vivem como se fossem descartáveis. O papa Francisco tem chamado atenção para isso. Ele denuncia o que tem chamado de “globalização da indiferença”. Para superar essa situação, temos de fazer o que Jesus diz ao professor da Bíblia. Depois que lhe conta a história do samaritano que cuidou do homem ferido à margem da estrada, Jesus disse: “Vai e faze o mesmo”.
Essa é a proposta da Campanha da Fraternidade deste ano:
o olhar sobre a realidade do mundo e especialmente do Brasil.
o discernir o que Deus nos diz sobre isso que vemos e finalmente
o que Ele nos pede como resposta ao desafio apresentado.
O Texto-base da CF 2020, em sua primeira parte, mostra que a realidade atual é consequência de um modo de olhar que descuida da vida das pessoas e da natureza. O texto-base lembra a precarização da saúde e da educação no Brasil. Todos sabemos que o fator que gera tantas injustiças é o aumento descomunal da desigualdade social.
Além da violência que assola as relações humanas, diariamente, nas periferias das cidades, mesmo do interior, somos confrontados com o assassinato brutal de jovens, em sua imensa maioria pobres e negros. Chegam a ser 63 assassinatos de jovens por dia. Um a cada 23 minutos. Um verdadeiro genocídio.
Além disso, a ONU e os organismos internacionais têm denunciado que, no Brasil, os povos indígenas nunca tiveram a sua sobrevivência tão ameaçada quanto agora. E essa mesma ameaça pesa sobre a natureza e os bens da terra.
Na segunda parte, a partir da revelação bíblica, o texto-base aprofunda uma palavra de fé que nos ajuda a unir a espiritualidade pascal à urgência de transformar essa realidade. O apelo é que todas as comunidades e organismos de Igrejas possam ser escolas de solidariedade entre seus membros, com as pessoas mais carentes e em comunhão com a natureza.
Em sua terceira parte, o texto-base propõe iniciativas comunitárias para gerar experiências de solidariedade e inclusão. Tomando como exemplo a irmã Dulce, hoje chamada pela Igreja de Santa Dulce dos Pobres, a Campanha da Fraternidade nos confirma: só somos verdadeiramente humanos/as quando somos pessoas de solidariedade e compaixão.
Marcelo Barros
Monge beneditino, chamado a trabalhar pela unidade das Igrejas e das tradições religiosas. Adora os movimentos populares e especialmente o MST.