Neste ano, o 05 de junho, que a ONU consagra como Dia Internacional do Ambiente encontra o Brasil em plena quarentena. É verdade que o governo federal além de estimular as mineradoras que têm poluído as águas, destruído rios e provocado os maiores desastres ambientais, ainda promove na Amazônia o maior desmatamento da floresta nas últimas décadas. Apesar disso, as notícias do Brasil e do mundo é que a natureza tem aproveitado este tempo de quarentena humana para se renovar. Desde décadas, o ar em nossas grandes cidades nunca foi tão limpo. A ONU afirma que, apenas dois ou três meses de menos poluição da atmosfera foi suficiente para fechar o buraco de ozônio que ameaçava o seres vivos com diversas doenças. Por todo o mundo, pássaros, peixes e aves parecem se sentir mais seguros de aparecerem no circuito urbano. Este fenômeno pode ser visto positivamente como sinal de que a natureza se renova e pode também ser interpretado como o sinal claro de que os animais e a própria terra não têm mais como se defender. E sabem que assim que a pandemia começar a ceder, tudo tende a voltar à normalidade.

Há alguns anos, a Global Food Print Network e outras entidades científicas que seguem a situação de saúde do planeta vêm nos alertando para o Earth Overshoot Day. Esse seria o dia em que os limites de sustentabilidade da Terra seriam ultrapassados e o equilíbrio da vida no planeta, totalmente ameaçado. Em alguns pontos, já atingimos este patamar do não retorno. No momento atual, para atender às necessidades da humanidade, precisaríamos de mais de uma Terra. Garantir ainda o que resta dessa sustentabilidade do planeta é a premissa indispensável para resolver os outros aspectos da crise: social, alimentar, energética, econômica, cultural.

Infelizmente, governos e instituições internacionais continuam insistindo no modelo capitalista depredador. A cada ano, os governos destinam somas imensas para armamentos e guerras. O Banco Mundial faz qualquer coisa para salvar bancos e multinacionais irresponsáveis que perderam dinheiro no cassino financeiro da imprevisibilidade. Há mais de dez anos, a imprensa denunciava: “Esse dinheiro do povo, dado aos ricos, ‘é um valor 40 vezes maior do que os recursos destinados a combater as mudanças climáticas no mundo e a pobreza’” (Le Monde Diplomatique Brasil, maio de 2009, p. 3).

Para quem vive a busca espiritual, o cuidado amoroso com a Mãe Terra, com a água e com todo ser vivo fazem parte do testemunho que Deus é amor, está presente e atuante no universo. Apesar de todas as agressões e crimes cometidos contra o planeta, ainda podemos salvá-lo. Em 2003, a Unesco assumiu a Carta da Terra, como instrumento educativo e referência ética para o desenvolvimento sustentável. Participaram ativamente de sua concepção humanistas e pensadores do mundo inteiro. É preciso que a ONU assuma e ponha em prática esse documento que qualquer pessoa pode ler e comentar na internet (basta consultar: “Carta da Terra”). É o esboço de uma “declaração dos direitos da Terra e da vida” e todos nós precisamos defendê-los.

Há cinco anos, o papa Francisco dirigiu a toda humanidade uma carta-encíclica sobre o cuidado com a Terra, nossa casa comum: a Laudato si, palavras inspiradas no cântico com o qual São Francisco louva a Deus por todas as criaturas. Agora, o papa propõe um ano especial no qual se releia a sua carta e se renove de modo mais profundo a aliança de toda a humanidade para cuidar mais e melhor da Terra. Afirma que as religiões e tradições espirituais devem se unir para fortalecer essa aliança de todos pela vida. Em cada tradição espiritual, precisamos explicitar e desenvolver o mais profundamente possível uma verdadeira veneração pela terra, pela água e por todos os seres vivos, como sacrários ou ainda ícones vivos do Espírito Divino. É preciso que a vida pós-pandemia seja norteada pela Ecologia Integral que une o cuidado do ambiente, a justiça social e a espiritualidade da paz e da amorosidade universal. Como diz uma oração que os cristãos das Igrejas mais antigas cantam em cada celebração eucarística: “Os céus e a terra estão cheios da tua glória, ou seja, da tua presença amorosa”.

 

Marcelo Barros
Monge beneditino, chamado a trabalhar pela unidade das Igrejas e das tradições religiosas. Adora os movimentos populares e especialmente o MST.