Agora é ainda mais urgente dar ouvidos à palavra credível – e vale ouro pronunciá-la. Seja cultivada a capacidade para ouvir discursos com credibilidade e invista-se também na habilidade para pronunciamentos que, efetivamente, estejam alicerçados na verdade. A sociedade precisa ser interpelada por palavras credíveis, necessárias aos processos de reconstrução e recomposição de seu tecido sociopolítico. Ora, não basta simplesmente dizer o que se quer ou o que se pensa, nem opinar a partir das estreitezas de uma determinada perspectiva. Revitalizar o protagonismo da palavra credível é obrigação cidadã, remédio às opiniões polarizadas e aos posicionamentos que desagregam. A cidadania qualificada reconhece: a credibilidade nos discursos representa uma necessidade para o diálogo social que é capaz de edificar nova cultura.
Nessa perspectiva e considerando as disputas eleitorais no horizonte da sociedade brasileira, os diálogos sobre política não devem se restringir aos nomes de candidatos. Ao invés disso, o processo eleitoral precisa ser oportunidade para amplo diálogo, a partir da compreensão de que a participação cidadã não termina com a conclusão da etapa eleitoral. Infelizmente, há um entendimento equivocado sobre o campo político que impõe limites e cegueiras a muitas pessoas, permitindo hegemonias e domínios que atrasam transformações civilizatórias inadiáveis. Esses limites e cegueiras são fortalecidos por equívocos do contexto partidário, grande responsável na difusão de inadequado entendimento sobre a política. Dessa forma, muitos desconsideram o papel da política na configuração de uma cidadania capaz de dar rumos novos à sociedade, desde o âmbito da representatividade parlamentar e governamental àquele que permite aos cidadãos e cidadãs uma interação inteligente, colaborativa, necessária à promoção da igualdade social.
A política, em seu sentido amplo, relacionado ao permanente exercício da cidadania, é protagonista na construção de uma nova cultura, tecida a partir do compromisso social de se promover a palavra credível. O Papa Francisco tem insistido: é urgente e inegociável investir na cultura do encontro para superar aquelas dialéticas que resultam, simplesmente, em desavenças – “uns contra os outros”. Note-se que a política partidária no Brasil tem se tornado uma promotora de polarizações, anulando possíveis avanços que dependem da capacidade para o diálogo. Por isso mesmo, é necessário priorizar a palavra credível. Um caminho que se efetiva aprendendo o que canta Vinícius de Morais, no Samba da Benção, citado pelo Papa Francisco, na sua Carta Encíclica Fratelli Tutti: “A vida é a arte do encontro, embora haja tanto desencontro na vida”. Interpelante é a imagem ali evocada, ao falar de um estilo de vida onde as diferenças podem conviver, integrando-se, enriquecendo-se e iluminando-se reciprocamente.
Sempre se pode aprender algo com o outro – ninguém pode ser desconsiderado. A reverência a esse princípio cidadão aponta a importância singular de cada encontro, ancorado na fidelidade à palavra credível – que significa respeito ao outro e ao cumprimento fraterno da tarefa de se exercitar a capacidade da escuta. Eis um caminho para constituir nova cultura, fruto de dinâmicas relacionais marcadas por falas e escutas que busquem alcançar respostas novas, qualificar escolhas, distanciando-se da ânsia de impor opiniões pessoais, não raramente resultado de cristalizações subjetivas, interesses balizados pela mesquinhez e pela ganância. Sejam cada vez mais cultivados o entusiasmo e a aspiração pelo contato que configura a colaboração entre as pessoas, objetivando a construção de uma sociedade mais justa e solidária, capaz de vencer a exclusão social. Nesse necessário processo de colaboração, a palavra credível é um discurso capaz de construir novas narrativas que promovam a paz – superando aquelas delineadas nas disputas partidárias interesseiras.
A palavra credível, sincera, transparente e indissociável da capacidade para escutar pode levar à cultura do encontro. Essa palavra jamais irá comprometer a sinceridade e a verdade. É urgente reconhecer: a palavra credível, bem diferente dos discursos populistas, manipuladores, regidos por interesses cartoriais, consegue promover o encontro. Desencadeia dinâmicas que contribuem para a civilização tornar-se “capaz de recolher as diferenças”, conforme diz o Papa Francisco, que acrescenta: “Armemos os nossos filhos com as armas do diálogo. Ensinemos-lhes a boa batalha do encontro” – somente exequível por meio do compromisso sério com a palavra credível.
Dom Walmor Oliveira de Azevedo
Arcebispo metropolitano de Belo Horizonte, Presidente da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB).