Não reconheci o número na tela do celular. Devia ser telemarketing, mas resolvi arriscar. Atendi e murmurei qualquer coisa, para ver quem estava do outro lado da linha.
– Senhor Mauro? – perguntou uma voz desconhecida.
– Sim.
– Boa tarde. Meu nome é Luana, somos do Portal do Servidor e estamos atualizando nosso cadastro.
– Deve haver algum engano.
– Mas o senhor não trabalha no serviço público, senhor Mário?
Pensei em deixar para lá, já que todo mundo confunde meu nome, mas resolvi corrigir.
– Mauro. O certo é Mauro. Mas a verdade é que não trabalho no serviço público, não.
– Mas aqui no nosso sistema consta o senhor como ativo no governo. E aí estou ligando pra enviar o link com o passo a passo pro senhor atualizar seu cadastro. Com isso, o senhor poderá fazer empréstimo consignado. O valor será debitado diretamente do seu contracheque todo mês.
– Mas realmente não é o caso. Nunca trabalhei no serviço público.
Ela se surpreendeu:
– Em nenhuma área do serviço público municipal, estadual ou federal?
Ao escutá-la, caiu a ficha.
– Tem razão – lembrei-me. – Trabalhei como diretor-geral do Tribunal de Justiça do Estado do Rio.
Ela pareceu contente.
– É isso!
Tratei de esvaziar seu otimismo:
– Mas já tem mais de quatro anos que saí.
Ela ficou decepcionada.
– Peço desculpas pelo incômodo, então. É que consta como se você ainda estivesse trabalhando no serviço público.
Nessa altura, já estávamos íntimos e ela me chamava de você.
– Eram outros tempos. Tempos de bonança, Luana.
A moça insistiu:
– E como você está hoje, Mauro? Aposentado, autônomo, na iniciativa privada?
– Desempregado mesmo. Faço parte dos 14 milhões de brasileiros – respondi.
Ela se mostrou solidária:
– Ah, a pandemia, né?
– Na verdade, não. Estou sem emprego desde que saí do Tribunal, em fevereiro de 2017. Não sei o que é contracheque faz tempo.
Ela não perdeu a oportunidade:
– Mas se você está desempregado pode estar precisando de dinheiro. Podemos arrumar um empréstimo pra você.
Luana era bem treinada, há que se reconhecer. Mas eu também tenho meus truques:
– Não preciso de empréstimo, preciso de emprego.
Ela riu. É que eu havia falado em tom bem-humorado. Aproveitei o clima amistoso e disse:
– Aliás, se você souber de alguma coisa me avise. Aí na sua empresa não tem lugar pra mim, não?
– Nosso setor está enxugando – desculpou-se ela.
– Eu entendo.
Luana precisava desligar, deu para perceber, tinha que sair à caça de outros clientes, já que a conversa com o senhor Mauro não dera em nada.
– Agradeço sua atenção, Mauro. Você é muito gentil.
– Você também, Luana. E não esquece de mim se pintar alguma coisa.
– Pode deixar.
– Tchau, Luana. Boa sorte.
– Tchau, Mauro, pra você também.

Mauro Ventura