O papa Francisco assertivamente afirma, no início do capítulo primeiro de sua carta encíclica Fratelli tutti: “A história dá sinais de regressão. Reacendem-se conflitos anacrônicos que se consideravam superados, ressurgem nacionalismos fechados, exacerbados, ressentidos e agressivos”. Mais adiante, o papa aponta para a existência de um fenômeno, “uma espécie de desconstrucionismo, em que a liberdade humana pretende construir tudo a partir do zero”. Para isso, vale-se até mesmo do caos. Entre as vítimas desse processo estão as instituições. Perversas dinâmicas tentam enfraquecê-las, ameaçando fazê-las desaparecer. O objetivo é garantir “caminho livre” para a disseminação de absurdos.

Trata-se de um processo suicida, com ataques que buscam convencer a população de que é possível viver sem as instituições. Esses ataques são promovidos por quem conhece as forças e fraquezas de contextos institucionais. Os resultados nefastos levam a uma espécie de anarquia e de descrédito, solapando raízes importantes e intocáveis que asseguram o Estado democrático de direito. Esses ataques também enfraquecem fundamentos bimilenares que sustentam serviços educativos e culturais decisivos para avanços na humanidade. Curiosamente, aqueles que combatem as instituições se autoproclamam avessos a ideologias nefastas e inaceitáveis, mas apenas se revestem de uma fachada para iludir, pois empunham “bandeiras” da irracionalidade.

A força perversa do desconstrucionismo é velada, com propriedades para arrebanhar muitas pessoas – naturalmente os incautos e os pouco conscientes a respeito de um mundo fechado em suas sombras. Em razão da incapacidade para discernir, aqueles que se propõem a defender valores e princípios inegociáveis de suas instituições promovem o inverso. Prejudicam seus contextos institucionais. Servem de estopim e provocam explosões na instituição em que estão vinculados. Estão sempre nos fronts de ataques com seus posicionamentos. Em vez de defenderem seus contextos institucionais, acabam por contribuir com aqueles desejam destruí-los. Não são bastiões da verdade, dos valores e dos princípios que anunciam defender. Ao contrário, alimentam rupturas, distanciando-se de suas instituições, fragilizando-as e, consequentemente, enfraquecendo-se.

Nas fileiras dos que atacam as instituições estão os que abraçam radicalismos e extremismos, fortemente presentes nas redes sociais. Em nome da defesa de uma perspectiva, radicais e extremistas acham-se no direito de promover ataques e destruições. Propõem-se a demolir imagens, reputações e funcionamentos institucionais. Distanciam-se do objetivo de promover ajustes ou recomposições. Acham que suas considerações são profecias, mas, na verdade, constituem alimento para rupturas anarquistas.

Essas pessoas têm pouco tecido humanístico e objetivam promover absurdos. Pautam suas palavras e posicionamentos para causar desmoralização, cooptando a opinião pública. Assim, ganham visibilidade pelo viés de uma perversão. Aparentam ser defensores do que é incontestável, especialmente nos ambientes religioso e político, mas suas atitudes fundamentam-se em um autoritarismo fecundado por exacerbado subjetivismo e narcisismo. Conseguem iludir muitos. Contribuem para promover a decomposição social, prejudicando a sociedade no enfrentamento de tarefas urgentes, a exemplo da busca pela superação de muitas crises, da pandemia com seus números assustadores de mortos e infectados, da desigualdade cruel que acentua a pobreza. No lugar de soluções para problemas urgentes, os que se dedicam a extremismos e radicalismos querem mesmo é ver “o circo pegar fogo”.

As instituições devem ser fortalecidas, e não atacadas, corrigindo as suas fragilidades a partir do retorno permanente ao núcleo de suas identidades. Isto se faz a partir de diálogos com força educativa. Assim, a humanidade supera o que a aprisiona em um mundo fechado por sombras. O papa Francisco ensina na carta encíclica Fratelli tutti sobre a tática de grupos e segmentos radicais. “Eles sabem que a melhor maneira de dominar e avançar sem entraves é semear o desânimo e despertar uma desconfiança constante, mesmo disfarçada por detrás da defesa de alguns valores”. Os cristãos, em interface ecumênica e inter-religiosa, na fidelidade ao Evangelho de Jesus Cristo, têm o dever de investir no diálogo como compromisso fraterno de amor. Fiéis a Cristo que fez do que era dividido uma unidade, os discípulos de Jesus devem superar o entendimento de que vencer é sinônimo de destruição. É hora das profecias capazes de promover restaurações substituírem as rupturas que buscam fazer prevalecer o absurdo.

 

Dom Walmor Oliveira de Azevedo
Arcebispo metropolitano de Belo Horizonte, Presidente da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB).