O mundo hodierno é barulhento em muitos aspectos. Também as palavras estão excessivas, de modo que acabam por perder sua força. Se, pois, com a quase universalização da internet, vimos crescer uma democratização da palavra e dos discursos, há também o excesso de opiniões, com a consequente desvalorização das pessoas capacitadas em suas áreas de fala. Estamos na era do palavrório, quando há muito o que se diz, e pouco o que se entende. É preciso reconhecer, no entanto, que ainda assim, mais que nunca que temos a possibilidade de compreender perspectivas, conhecer novas visões de mundo e da realidade… Para que essa oportunidade seja bem aproveitada, é preciso que aprendamos a redescobrir a capacidade de escuta.

Recordo-me sempre do Rubem Alves, que dizia da necessidade de cursos de “escutatória”. De fato, desde a Antiguidade clássica se vê pulular ofertas de cursos de retórica. O Ocidente sempre valorizou, e muito, a arte da fala. Rubem Alves, pessoa bastante atenta, percebeu com grande sensibilidade nossa atingida incapacidade de escutar. Numa conversa, quando uma pessoa está silente enquanto a outra fala, a cabeça da primeira fervilha, já pensando em sua fala seguinte, e por aí vai. Isso quando há silêncio enquanto a outra pessoa fala, pois, por muitas vezes, o ciclo de interrupções é constante. Quanto mais apaixonada a conversa, mais empolgação e, aí, o risco é de não acontecer escuta.

Da crise de fé, entre os que creem ter fé, que podemos perceber em nossa época, parte do motivo pode ser compreendido a partir dessa incapacidade adquirida de escutar. A fé judaica nasce da escuta: o credo judaico, aliás, afirma necessariamente isso. “Ouve, Israel! O Senhor nosso Deus é o único Senhor” (Deuteronômio 6,4). Para o cristianismo, nascido dessa tradição, não é muito diferente: “[…] E como crerão naquele que não ouviram? E como o ouvirão, se ninguém o proclama? […]” (Romanos 10,14). A fé cristã foi ainda mais além: compreendeu que a própria Palavra de Deus se encarnou, fez-se pessoa humana. A Palavra de Deus se tornou coisa nossa! Com a encarnação da Palavra temos, pois, uma comunicação de carne, entre Deus e nós. Uma Palavra que ecoa desde dentro, que emerge dos poros.

É preciso que façamos uma redescoberta da Palavra, para que a fé cristã seja, realmente, transformadora na vida dos batizados e batizadas, trazendo eficazes contribuições para o mundo e a sociedade. Esvaziarmo-nos de nossas palavras para que sejamos preenchidos pela Palavra. Essa redescoberta da Palavra passa pelo reaprendizado da escuta. Assim, seremos capazes de deixar que essa Palavra ecoe em nós, de modo que a percebamos sem os ruídos de nosso próprio palavrório, mesmo que um palavrório religioso e bem-intencionado. Com o canto do padre Zezinho, podemos fazer nossa oração-aprendizado: “Dá-me a palavra certa, na hora certa e do jeito certo; e pra pessoa certa”.

Felipe Magalhães Francisco – Dom Total